(este texto complementa o texto anterior sobre calvinismo)
João Calvino (1509-1564) é o iniciador da denominação protestante dita "calvinista", ou também "presbiteriana". Nasceu na França, onde estudou Direito, antes de se domiciliar em Genebra. Em 1527/8, embora educado na religião católica, passou-se para as idéias transformadoras que percorriam a Europa desde o brado de Lutero em 1517. Caiu então sob a perseguição antiprotestante movida pelo governo francês. Emigrou para Basiléia (Suíça), onde escreveu sua obra principal, Instituição da Religião Cristã, que se opunha fortemente à doutrina católica relativa aos dogmas, aos sacramentos e ao culto.
De Basiléia, querendo voltar à França para breve visita, passou por Genebra, onde o reformador local, Guilherme Farel, pediu-lhe que servisse à comunidade protestante da cidade, que se declarara oficialmente protestante. Tendo acedido (aceitado), Calvino instaurou em Genebra severa disciplina, cerceando a liberdade de consciência e de conduta dos cidadãos. A oposição, em 1538, conseguiu expulsar de Genebra Calvino e Farel; após três anos de ausência, voltou aquele gloriosamente, chamado por representantes da cidade. Passou então a desenvolver atividade cada vez mais intensa como teólogo e organizador.
Salvação e condenação eterna: predestinações
A teologia de Calvino, embora se assemelhasse à de Lutero, tem seu ponto característico no conceito de Deus. Colocou a ênfase sobre a majestade divina, a ponto de dizer que há duas predestinações: uma para a salvação e outra, explícita, para a condenação eterna. Deus não apenas permite a perda dos pecadores, mas os impele para o abismo. Deus, segundo consta, proíbe o pecado a todos, mas na verdade quer que alguns pequem, porque devem atrair discípulos, pois afirmava que todo aquele que crê realmente na justificação por Cristo, é do número dos predestinados e pode viver tranqüilamente, pois a salvação já lhe está garantida.
Ao organizar a Igreja, Calvino instituiu duas comissões: a "Venerável Companhia", dos pastores e doutores, encarregada do magistério; e o "Consistório", composto por pregadores e 12 senadores leigos, que tinha a tarefa de zelar pela disciplina, à semelhança da inquisição medieval. Esta comissão visitava as casas, servia-se de denúncias e espionagem paga; os réus gravemente culpados, se persistissem no erro, eram entregues a um tribunal. Este proferiu, de 1541 a 1546, 58 sentenças de morte; a tortura era aplicada com freqüência.
A população de Genebra teve que se submeter à disciplina calvinista: as festas eclesiásticas foram reduzidas aos domingos, o culto se limitou à oração, à pregação e ao canto de salmos, com a celebração da Santa Ceia quatro vezes por ano. A vida social tomou um aspecto tristonho, pois foram abolidos o teatro, as danças, o jogo de cartas, a pompa das vestes. O espírito calvinista é pessimista; por isso afasta-se de tudo que possa vir a ornamentar a natureza humana, corrompida pelo pecado.
Calvino declarou guerra aos humanistas, que eram os libertinos no plano moral; Lutero os aceitara, porque ao menos combatiam o Papado. Os calvinistas se tornaram, em seus primeiros tempos, inimigos da ciência, da arte e da literatura, concebendo uma verdadeira fobia do prazer.
Os adversários do sistema foram reduzidos ao silêncio mediante duras punições. O médico Jerônimo Bolsec, proveniente de Paris, que ousara sublevar-se contra a doutrina de Calvino sobre a predestinação, foi exilado em 1551; o humanista e médico espanhol Miguel Servet foi queimado vivo em 27/10/1553 por ter negado o dogma da Santíssima Trindade. Em 1555, Calvino havia conquistado vitória sobre todos os seus inimigos. Nenhum pôde mais lhe abalar a posição de ditador religioso, e também político, na sua "Roma protestante", para onde afluíam os emigrados protestantes da França, da Itália e da Inglaterra.
Os calvinistas se propagaram pela França, Inglaterra, Escócia e Holanda, países navegadores que levaram as novas idéias para as terras orientais e ocidentais recém-descobertas. A partir da segunda metade do século XVI, foi lhes dado o nome de "Igreja Reformada", que se tornou importante força no campo da economia, do comércio e da política, respondendo pelo puritanismo e pelo espírito de conquista de povos anglo-saxões e germânicos.
O.S.B. BETTENCOURT TAVARES, Estevão. Crenças, religiões e seitas: quem são?. p. 29-30-31. ed. O mensageiro de Santo Antônio. Santo André. SP. 1999.
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